Por Elaine Frere
Vale a reflexão!
Não esta que o título sugere, mas aquela que o texto propõe sobre o quanto do que consideramos realizações pessoais, vai realmente ao encontro do nosso sonho de realização; o quanto do que pensamos escandalizar, realmente foi escandalizado conforme planejamos; o quanto do que nos propusemos a mudar, foi realmente mudado conforme nossa pretensão.
O texto de Mário Bortolotto de início parece caminhar pelo já conhecido e amplamente discutido universo das preocupações, ansiedades e banalidades juvenis. Amparado no caminho certeiro da comédia, se revela uma inteligente construção dramatúrgica, que conduz a um engraçado e surpreendente desfecho para as personagens. Surpreendente porque nos leva a constatar o óbvio, talvez nunca antes refletido: “Ser ou não ser, eis a questão!”
Os sonhos que tivemos se tornaram realidade, tal qual foram sonhados, ou foram simplesmente moldados e transformados em realizações possíveis diante da vida, nos deixando acreditar que tudo saiu conforme planejamos?
Assim se apresentam os inseparáveis amigos Mário Jr. e Beto Virgem, personagens da trama. Mário Jr. sonha ser músico e termina vendedor de loja de instrumento musical, julgando ter realizado com isso o seu sonho juvenil. Já Beto Virgem sonha ser poeta e jornalista “cabeça” e termina escrevendo fofocas para o Jornal Metrô News, emprego que considera importante e realizador de suas aspirações.
O texto de Bortolotto tem 23 anos, é atualíssimo e revelador de uma trajetória que se aplica possivelmente a toda uma geração, mesmo que não nos demos conta disso. Isso pode ser constatado pelo efeito do espetáculo, embora quem assista à peça e esteja na faixa etária dos personagens vá provavelmente se divertir, sem, no entanto, se enxergar ali. Talvez isso aconteça daqui a vinte e três anos.
Então, o texto de Mário Bortolotto reflete não o modo de pensar e de agir de uma geração, como parece no princípio. É, por assim dizer, um retrato do modo de pensar e de agir de um povo, ao longo do tempo. Nem por isso é emblemático, sério ou provoca reflexões imediatas. Ao contrário, é leve, divertido e provoca reflexões a longo prazo... Impagáveis reflexões! Até mesmo esta: Será que a gente influencia o Caetano? Enquanto sociedade, enquanto país, enquanto ser humano... Quanto da trajetória desses monstros sagrados das Artes se completou da forma como idealizaram, uma vez que o próprio Caetano, hoje, canta ao lado de Roberto Carlos, representante mais direto de formas de pensar e produzir, absolutamente adversas, no passado?
Vale aqui contar uma breve história cujo desfecho vai ao encontro do tema da peça: Uma amiga me confidenciou, esta semana, ter ido a um guru. Em sua consulta ela afirma ter dito que fora uma “ovelha negra” da família, bem ao estilo Rita Lee, pois sua mãe a ensinara a ser dona de casa, costurar e prestar trabalho voluntário com crianças, e ela, uma revolucionária, se tornara uma artista. Questionada sobre quais suas atribuições na condição de artista ela respondeu o seguinte: “hoje passo a maior parte do tempo trabalhando em casa, faço a produção dos meus trabalhos, costuro meus figurinos, e atuo junto à infância, faço festas infantis”... Ao que o guru respondeu prontamente: Ok, exatamente como sua mãe planejara, dona de casa, costureira e trabalha com crianças!
E Rita Lee? Tornou-se mãe, construiu uma família nos moldes tradicionais e hoje canta ao lado de Roberto Carlos, também!.
O que diria Freud sobre isso? Não sei, não entendo Freud! Nunca entendi!
E agora, você, leitor deve estar se perguntando: Como alguém se propõe a escrever sobre a existência humana sem entender Freud?
Eu te respondo: fui influenciada pelo Caetano, digo, pela jovialidade dos personagens da peça do Mário Bortolotto, mas a verdade é que não sei o quanto do que realizo vai ao encontro ao meu sonho de realização em toda a sua amplitude, e talvez eu faça parte dessa maioria representada no texto do Mário Bortolotto. Sinceramente, espero que daqui há uns 23 anos eu descubra que não!
segunda-feira, 2 de março de 2009
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